Wednesday, September 23, 2009

A história de "gebreguedo"

Gebreguedo mandou este comentário para meus 2 blogs, o que me leva a crer que não se importará se eu utilizar seu relato para uma pequena análise. Eis o comentário (copy paste):


Blogger 
gebreguedo said...
Tenho 53 anos, sou separada, moro com minha mãe de 79 anos e meu filho de 22 que está desempregado, contibuo para o INSS a mais de 21 anos, sem nunca ter utilizado qualquer serviço da entidade. Sou sustento de família. Tabalho no Depto. de compras de uma empresa de eventos onde a pressão e o stress é muito grande em virtude do prazo de entrega e da logística dos eventos. Em agosto/2008 comecei a sentir alguns sintomas, angustia, falha na memória, choro fácil, dificuldade em dormir e acordar, mas não dei muita atenção pois a empresa estava as véperas de um grande evento achando que era devido ao acumulo de trabalha. Estava enganada, os sintomas pioraram, e apesar de diversa atitudes negativas por parte da empresa, agüentei até dezembro/2008 quando a mesma nos deu férias. Os sintomas continuaram a piorar e no começo de janeiro/09 eu surtei. Tive acessos de choro, não queria sair de casa, ouvia vozes, via vultos, não dormia ou então dormia demais, não comia ou então me enchia de comer, não sento que essa pessoa seja eu. Fui levada a um psiquiatra que constatou que eu estava com depressão profunda e pediu o meu afastamento - CID10 – F32.3 + 40.08 e me medicou com fluoxetina e bromazepam. Que me deram um certo sossego e me ajudam a dormir melhor. Na primeira perícia me foi concedido auxílio doença por três meses. Voltei ao psiquiatra, que atestou que a melhora foi leve, mas coom aparecimento de novos sintomas: continuava oucindo vozes, a dificuldade de sair sozinha aumentou, o cansaço e o desanimo continuavam – Solicitou novo afastamento pelo período mínimo de 6 meses – CID10 f32.3 + F40.8 + F34.1. Já meio relutante o perito do INSs concedeu auxílio por mais 4 meses. Agora em setembro tive nova perícia e apresentei um laudo do psiquiatra confirmando a solicitação de afastamento pelo período mínimo de seis meses- CID10 – f32.3 + F40.8 + F34.1 + F06.8 e o aumento na dosagem dos medicamentos: fluoxetina - fenobarbital e clopromazina. O perito mal olhou o laudo, não verificou as receitas e não permitiu a entrada da minha acompnhante. Apenas perguntou como eu me sentia, mas a entrada de uma funcionaria trazendo papeis para ele assinar, interrompeu e depois ele e perguntou a cidade em que trabalhava. E em menos de 10 minutos NEGOU a prorrogação e me dispensou feito sapato velho dizento que se eu quisesse poderia marcar uma nova perícia para reconsideração . Agendei o pedido de reconsideração, mas estou sem receber e estou desesperada pois me disseram que dificilmente um perito da mesma agencia ira contra o laudo do outro, o que aumentou os meus sintomas. Os remédios me dão algum alivio,mas me deixam de cabeça vazia e zonsa e não me deixam pensar ou fazer algum trabalho direito. Tenho certeza de que no retorno a empresa irá me dispensar (depoimento escrito pelo meu filho Danilo)
September 21, 2009 3:57 PM
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Daí tiramos alguns elementos para pensar um pouco:
1) Esses dias li sobre afinal a France Telecom começar a dar importância para a sensível ocorrência de suicídios motivados - segundo relatos póstumos dos suicidas e até daqueles que n conseguiram dar cabo da própria vida - pelas condições de trabalho.
França = primeiro mundo. Andamos lendo muito por aí sobre grandes conglomerados que incorporam atividades de lazer, atendimento psicossocial, com psicólogo/psiquiatra disponível para os funcionários, programas de yoga e outros exercícios durante o expediente, salas de relaxamento, etc, etc, etc.
É mentira? Não. Realmente há várias empresas (dentre as maiores) preocupando-se com essas questões. Assim como também é verdade que o que está sendo feito é melhor que nada, mas n está nem perto de ser suficiente. Nem no primeiro mundo nem AQUI.
Por experiência própria, já tive muitos dissabores com:
1) a forma que um paciente psiquiátrico é tratado (isso quando o indivíduo procura tratamento, etc).
2) a forma com que a própria psiquiatria/psicologia e afins são vistas pela sociedade, e até mesmo por profissionais da medicina - supostamente, colegas.
Numa função como a que a gebreguedo descreveu que exerce, é pouco provável que ela possa dar-se ao luxo de tirar férias não-remuneradas. Até porque não são férias, pq ela não aproveita nada do tempo afastada; ela tenta recuperar a SAÚDE MENTAL (e, consequentemente, a física). Até porque é difícil que alguém que seja o sustento da família possa ficar tirando férias. De acordo com a descrição dos sintomas e de posse de laudo atestando a necessidade de um afastamento maior (Gente, problemas dessa ordem NÃO se resolvem rapidamente, depressão profunda NÃO é um resfriado ou mesmo uma cirurgia mais simples), gebreguedo volta para a perícia do Instituto Nacional de Seguridade Social, onde lhe é negado novo afastamento - APESAR de portar um laudo provavelmente assinado e com a identificação/registro do profissional psiquiatra. Ok, a perícia tem que ser feita, não se pode apenas corroborar o laudo que veio de fora. Mas não da forma como gebreguedo relatou que aconteceu. (ou melhor, NÃO aconteceu). Já li várias coisas sobre as perícias/os peritos do INSS há algum tempo. Os 2 lados. Inclusive sobre agressões a peritos que negavam licenças, etc. Sei que, infelizmente, ainda há, sim, gente que quer "dar um tempo" e tenta "ver se passa".
Em um mundo ideal, gebreguedo entenderia, talvez com a ajuda de medicamentos, que há uma série de coisas que precisam ser mudadas em seu entorno para que ela melhore. E que ela melhoraria SE essas coisas mudassem. A forma de encarar o emprego, os relacionamentos em casa (com a mãe idosa e com o filho que procura emprego), e até mesmo seu relacionamento consigo mesma. Entender suas expectativas, organizar o que é possível fazer e definir objetivos plausíveis para sua vida - afinal, não é lá muito animadora a perspectiva de continuidade indefinida de sua atual situação.
Isso em um mundo ideal. Que não existe.
Neste mundo em que vivemos gebreguedo e eu, somos cada vez mais escravos das situações, parece que estamos sempre correndo para tentar manter, minimamente, as coisas nos trilhos, pelo menos. Isso gera ansiedade: manter o emprego (será que, a esta altura do campeonato, alguém ainda pensa que gebreguedo ESCOLHEU ficar ruim?), lidar com sua própria vida, preocupar-se com as contas (estou desesperada, sem receber...), o filho, a mãe... a quem ela recorre para um apoio emocional? É um estado de coisas que vai minando a gente, dia após dia. E chega uma hora que o corpo reclama. E sabe quando vc está lá no alto da montanha, segurando-se da forma que pode para não cair - mas CAI? A queda, especialmente a psicológica, pode ser bem longa e profunda.
(Imagine, por um instante, gebreguedo agora, talvez em casa, mal, ainda tendo que lidar com tudo isso e com a certeza que ela expôs que, quando retornar ao trabalho será dispensada? Com 53 anos, infelizmente, as alternativas começam a rarear. Não conheço nada da vida dela além do que ela pôs nesse comentário/desabafo, mas não creio que ela esteja em vias de receber alguma herança milionária).
Voltando... E quando se cai, meu amigo, é necessário um conjunto de fatores que poucas pessoas têm para levantar.
Gebreguedo é mais um exemplo de como se espera que sejamos sempre leões, que estejamos sempre fortes e bem dispostos. De como não podemos falhar. Só que: 1) não somos todos iguais, reagimos às situações de forma individualizada - o que não significa que alguém seja melhor ou pior que outro por isso. 2) A situação dela já está BASTANTE complicada, e negar uma perícia digna e o respeito que ela merece como ser humano (se ela sentisse que está em condições, até para que, na hipótese da firma colocar alguém em seu lugar enquanto ela está afastada - lembrem-se - ela sustenta a família - e ela receber a notícia de que perdeu o lugar para essa pessoa quando voltasse - bem, se ela está em condições de voltar - o que a nova "perícia" concluiu, ao negar-lhe o auxílio-doença/licença, SERÁ que ainda assim - com a perspectiva de perder o emprego quanto mais tempo ficar longe - ela NÃO VOLTARIA?)
Gebreguedo já ficou afastada por 3 + 4 = 7 meses. Agora o psiquiatra diz que ela precisa de um novo afastamento de, no mínimo, mais 6 meses. Logo, gebreguedo tornou-se um PROBLEMA. Para seu empregador e para o Estado. A própria gebreguedo conta com a possibilidade de ser demitida. Isso "resolve" o problema do empregador". O Estado, esse "resolve" o problema da concessão do auxílio-doença NEGANDO o mesmo.
Provavelmente gebreguedo está pedindo demais. Uma política de seguridade social, para funcionar, tem que ser RÍGIDA. Colocar no mesmo balaio doentes e vagabundos. Ou tomar todos como vagabundos que é mais fácil. Gebreguedo que se vire. Afinal, ela é só mais um número de CPF, não é mesmo?
Parabéns, Brasil. Cada vez que me deparo com algo assim (e não é a 1a., 2a. ou 3a. vez), orgulho-me mais e mais do país em que vivo.
Como ironia não resolve nada, que seja feito algo por gebreguedo! Da minha parte, ge, se vc achar que pode ajudar em algo, está autorizada a levar meu comentário na perícia que vc remarcou. Outra coisa: NÃO aceite como um carneirinho que lhe seja negada a presença de um(a) acompanhante se vc não se sentir em condições de entrar sozinha e expor seus problemas. E sim, CAUSE: leia (ou faça com que seja lido) para o sr. perito o que eu escrevi.
E boa sorte.

1 comment:

Flavia Arcanjo said...

Bom dia, você pode me enviar o contato desta pessoa? Estou fazendo um trabalho sobre o INSS e este caso me ajudaria muito! Grata, Flá Arcanjo