Se ele conseguiu, por que eu não poderia? E ainda tem a vantagem que eu devo UM POUCO menos... (Créditos: UOL)
Mauricio de Sousa conta como deu a volta por cima após dívidas com parque da Mônica
Publicidade
DEPOIMENTO A...
MORRIS KACHANI
DE SÃO PAULO
MORRIS KACHANI
DE SÃO PAULO
Mauricio de Sousa, 77, criador da Mônica, do Cebolinha e do maior
estúdio da América Latina, chegou a correr o risco de ficar
inadimplente, com dívidas demais de R$ 40 milhões.
Eram débitos fiscais ou contraídos pela aquisição do parque da Mônica.
Danilo Verpa/Folhapress | ||
Mauricio de Sousa, no estúdio da Turma da Mônica, em SP |
A volta por cima passou por uma revisão dos negócios, demissão do corpo administrativo e renegociação da dívida.
Embora ainda não a tenha pago integralmente, a empresa se equilibrou, investe em novos segmentos e "vai bem, obrigado".
*
Todo mundo tem altos e baixos, a vida toda. De tanto que já apanhei, me
acostumei com a ideia de que pode não dar certo. Só acidentalmente você
tem 100% de resultado.
Várias vezes arregacei as mangas, investi, e não foi para frente. O
negócio é você atirar com espingarda de chumbinho. Se jogar mais
bolinhas no cano, algo você acertará.
O que sempre deu certo foram as histórias em quadrinhos. Cinema, nem
sempre. Tivemos problemas sérios nos anos 90 e decidimos parar. Os
planos econômicos nos tiraram o chão dos pés.
Os parques temáticos foram um sucesso, sempre operaram no azul. Muita gente até hoje me diz ter saudade.
Mas esbarramos em outros problemas. O Parque da Mônica se pagava. Mas o
custo da dívida que acumulei ao comprá-lo, no final do século passado,
não.
O parque era uma parceria com a Globo. Mas ela não foi adiante. Houve um
pouco de má administração de nosso lado, e a Globo saiu do negócio.
Um parque vive de renovação. Era preciso importar brinquedos, a taxas e
juros proibitivos. É difícil convencer investidores quando a conta não
fecha, quando há outras coisas que rendem mais. O shopping que abrigava o
parque também já não nos queria.
Acuado, desfiz o negócio em 2010 e decidi que não seria mais dono de
parques temáticos. É um investimento muito grande para nosso esquema.
Saí endividado.
De repente, tinha uma dívida que chegaria a R$ 40 milhões --à dívida do
parque se somaram as fiscais que eu não fazia a menor ideia. Outras
áreas da empresa estavam contaminadas. Houve confusão de documentação e
fui castigado pela má administração de meu pessoal.
Então troquei toda minha administração. Primeira coisa que pedi para o
novo rapaz que veio cuidar das contas: saber o que custa cada coisa,
como estamos cobrando.
Cheguei a receber uma proposta de aporte de R$ 2 bilhões de um grupo
estrangeiro, cinco anos atrás. Nem tive dúvida, antes de mais nada
porque não quero sócios. "Estou mal das pernas, nem sei o que tenho para
vender, espera eu arrumar a empresa e voltamos a falar", respondi.
Eu não sabia o que ganhava nem o que sobrava, uma confusão danada. Nem
sabia se teria dinheiro pra pagar o pessoal no mês seguinte.
Veio o Refis [programa de recuperação fiscal da Receita], ajeitamos as
contas. Logo a gente se livra dos rabichos que sobraram. Boa parte dos
que estão comigo hoje diz que não acreditava que conseguiríamos sair
dessa. O bom desempenho de alguns produtos, como Mônica Jovem e "graphic
novels", ajudou.
Hoje nosso foco é exportação. De três anos para cá, temos investido o
dinheiro que sobra nisso, pois a Turma da Mônica é universal e tem
público cativo em países como China, Itália, Portugal. Agora entraremos
com Neymar em quadrinhos na Espanha.
Exportar desenhos animados não rende muito, mas abre caminho para o
licenciamento internacional, e aí sim vejo ótimas possibilidades.
De toda forma, nunca perdi o sono. Hora de dormir é hora de dormir. No
início da carreira, eu trabalhava como repórter policial na Folha.
Além das reportagens, em meio à gritaria do fechamento --e da
barulheira das máquinas de datilografar--, eu tinha que fazer HQs para o
dia seguinte. Foi a melhor escola para eu aprender a não ficar
estressado no meio do Carnaval.
Eu era tudo que um repórter policial não devia ser. Não suportava ver
sangue e desmaiava. Lia um livro por dia e escrevia de forma clássica,
inspirado em Eça e Machado. Na Redação aprendi a utilizar uma linguagem
mais concisa... ideal para o balão de HQ.
Hoje tenho seis filhos, de quatro casamentos, e mais de vinte familiares
trabalhando na empresa. É uma mistura que deu certo. Mônica, minha
filha, é uma diretora comercial que sabe tudo. Minha mulher, Alice
Takeda, diretora de arte, é mais exigente que eu.
Trabalho praticamente todo o tempo. Ainda leio todos os roteiros, e
estou treinando minha filha Marina, 27, para me ajudar --e com ela
aprendo a linguagem das novas gerações. Trabalhar com familiares é
ótimo. A não ser na hora de mandar embora.
No comments:
Post a Comment